segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

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Foto: Cesar Brustolin
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Paço 1

no século XIX ele vivia às escuras
e cheirava a estrume das montarias e
das carroças misturado à lama das ruas

sua mente era marcada pelo sino das igrejas e
apitos dos engenhos e pelo cenário
cinza chuvoso que seus olhos retiam

ninguém jamais o veria sem guarda-chuva

em meio aos cafés confeitarias alfaiatarias
casas de moda cinemas chapelaria charutaria
ele era um cara parecido com Fernando Pessoa

ou talvez fosse o próprio
ao pé do Paço da Liberdade à época em que o Paço
não era o Paço mas o Mercado Municipal

sem dar bom dia a ninguém como alguém
que entrasse num elevador do
Centro Cívico numa segunda-feira
ele costumava pegar o bonde logo de manhã

em direção ao centro e seus cinemas
esconderijos perfeitos que muitos anos depois, digo
um dia viriam a ser o Ritz o Groff o Luz

pois, antes de mais nada
era um tímido patológico circulando por praças líricas
a conversar quando muito

em algum momento a conversar com a estátua
de um Generoso Marques que ainda nem mesmo
havia nem mesmo na pergunta
para que serve uma estátua?

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