sexta-feira, 29 de junho de 2012


nós os artistas queremos flores em vida
nós os artistas não queremos ser assassinados de madrugada
o mais criativo (e promissor) diretor revelado nos anos 70 carreira brilhante morte brutal a do escritor Wilson Bueno
nós os artistas ficamos felizes com auditórios bibliotecas cinemas que levam o nosso nome
mais do que auditórios bibliotecas cinemas que levam nosso nome nós os artistas queremos ocupar usar usufruir de auditórios bibliotecas cinemas
desde 1988 este          es         pa                    ço 
hoje MUMAMuseu Metropolitano de Arte Cine Guarani Auditório Antônio Carlos Kraide Casa da Leitura Wilson Bueno Centro de Arte Digital Espaço de Convivência Salas para Cursos Projetos de Ação Educativa

olá vidros, por vocês temos o sol
pisos e calçadas, vocês estão tão bonitos, agora aguentem o peso de uma vida na arte
mesa de som olá varas de luz livros olá computadores
a platéia está posta em meia lua? assim já fazemos a lua, hihihi
olá camarim, tim tim   o ESPAÇO tá lindo   MAIS VINHO, SENHORES

nós os artistas queremos MUDAR o teatro paranaense
Antonio Carlos Kraide mudou
é verdade tanto que há um teatro com seu nome sendo reinaugurado hoje
toda ação do artista no mundo é uma reinauguração constante
sua vocação é fazer de novo fazer de novo fazer de novo
a manhã seguinte é sempre uma insistência da ressurreição
este ESPAÇO estar acordando hoje depois de tantos anos é uma ressurreição

nós os ESPAÇOS culturais queremos fazer as artes avançarem
nós os ESPAÇOS culturais somos pretensiosos em nossa humildade (que é a condição de estar a serviço da arte)
o teatro paranaense era um antes foi outro depois do oxigênio do experimento de Kraide descendo do alto da XV fazendo dívida nas lojas do caminho coletando material para suas montagens e havia ganchos no teto de sua casa hoje casa do Diego Marchioro os ganchos ainda estão lá diga você Beto Bruel diga Enéas Luor Manoel Carlos Karam Fátima Ortiz o Pé no Palco já foi neste lugar aqui aqui quantos jovens já estudaram artes cênicas digam vocês que nunca pararam que nunca parem de dizer Kraide foi um cara iluminado diz Beto Bruel o maior iluminar da História

quatro anos em reforma e, eba, o es   pa        ço        tá lindo, piazada

ah o endereço foi totalmente adequado às normas de segurança do Corpo de Bombeiros e às
exigências de acessibilidade com elevadores rampas banheiros adaptados e pista tátil
nós os ESPAÇOS CULTURAIS agradecemos       
                                                                       muito muito muito muito obrigado mesmo
ah é um verdadeiro complexo arquitetônico
                                                                       muito muito muito muito obrigado
o ESPAÇO tá mesmo lindão, não tá?
                                                                       TÁ                 
TOMA CURITIBA
                        SOU    É                     TEU

é preciso que a gente continue ABRINDO ESPAÇOS ABRINDO ESPAÇOS  

            ABRINDO

ESPAÇOS      ABRINDO                ABRINDO

                                               ABRINDO

                                                           ABRINDO

                                                                                              ABRINDO

                                                                       ESPAÇOS

ES                  
                        PA      
                                               ÇOS                A                     BRINDO
                                                          
                                                           ABRINDO




quarta-feira, 27 de junho de 2012


alguns de nós acordamos ao amanhecer, outros não. e Ôzumano$ a nos dizer: bom dia, para jamais se envergonhar de ser um poeta, setor de culpabilização de poetas, disque dois. e nós: responda com arte, sim, os filhos da puta venceram, quem me conhece, me compra, quem não, teme. teme? antes esta migalha (façam o contrato para que eu me sinta um mendigo) que a ignorância suprema. diante de tamanha derrota: responder com arte, pode que seja pouco, pode que quase nada diante do tudo é mais que importante no mundo blindado do carreirismo das verdades absolutas, mas a minha vida inteira e mesmo depois dela, isto, arte (disque um). mas vão me cobrar ainda mais: e os custos, quem arca?, que piada, não é mesmo, esses candidatos à prefeito!, seus direitos autorais, em que pé estão?, que absurdo, né, a privatização da Pedreira!, você viu o que o Gentili falou no twitter sobre a loirinha que esquartejou o marido, hahaha? (humoristas brasileiros, vocês são a piada), e o Lula fechando com o Maluf, como não tem uma opinião?, se não é de direita nem de esquerda, você é então mais direita do que a direita!, e a Rio+20, foi, e aí, foi maneiro, maneiro, maneirão? ah, aceita a insuficiência, falo aos meus botões. eles riem de mim. fica feliz, dizem-me os botões, ainda olham para você aqueles que têm dentes. sim, é tão óbvio. os filhos da puta venceram e sequer mandam lembranças. por outro lado, o domador nunca saberá dançar como soubemos um dia nós, as bestas. reparemos melhor em nós mesmos, os mendigos do afeto, temos dentes bons mas não sorrimos bonito. damos atenção em troca de bóias de salvamento. e Ôzumano$: bom, dia, estamos aqui para melhor atendê-lo, para ir respondendo com bossa e botando fé no seu taco, disque três, para deixar que os outros transcendam por você com suas artes de comer pizza como bem lhes aprouver, disque quatro, para ir rolando a pedra, ó Sísifo, do seu jeitão, sem se desculpar por ser um poeta, disque cinco...

segunda-feira, 25 de junho de 2012


sob o sol, fazer com fúria, limparentrar no chão com o olho. mas só vejo o que se mostra. nada mais terrível. quem morreu de quem, pobre criatura de Deus e o sangue a pingar de seus afagos. fazer mais uma vez a alegria com dinheiro sucata ideológica franja na testa do búfalo feridas em seu esôfago tudo vira sopa, dinheiro animal roxo de espasmos animal aberto de gritos peitos de cimento. ser feliz na fúria, diz o juiz a me extrair as unhas dos pés, chacoalhar os lugares insuportáveis se acordamos para voltar a fazer cópias mal feitas de nós mesmos e à minha mente esta completa mentira se agarrou. fazer a alegria e, preservado reformado limpo o tempo todo, nada é mais ruína, complexa criatura sem Deus de Deus. qual a minha opinião? nem mesmo vejo o que se mostra na engenhosidade analítica, quais os meus desejos? coisas de mentira para com violência colocar em você, a minha fé, qual? de extremo, só a delicadeza. ah, a alegria nunca está pronta.

segunda-feira, 18 de junho de 2012


nem mesmo sei se gosto ou não de olhar a chuva da janela de casa. choro sempre. nada no mundo é uma resposta. e a chuva no verde musgo da mata, em meus olhos embolorados. e a chuva sem parar sem parar sem parar mesmo quando existem tantas outras palavras com as quais poderíamos dizer adeus. vê, vão os carros feito cardumes e é só minha a culpa se me afoguei dentro de um peixe. às vezes eu queria ser um bueiro, escuta estas vozes empoçadas, outrora esculturas de meu fôlego. se o frio é o meu país (meu direito e dever), na primeira oportunidade trairei a pátria.

domingo, 17 de junho de 2012

Pombas

petit pavê petit pavê petit pavê petit milho milho petit pavê petit pavê milho petit milho pavê petit pavê petit pavê milho milho petit pavê

Caçar

Fila enorme. De horas. Chega sua vez. A cadeira. O leão senta nela. A cadeira deita. A mão direita põe a luva na esquerda. A esquerda na direita. O avental borrado com a cor rubra. Luz forte vem de um braço alto da cadeira. Abra, diz o do avental. Aguinha gelada da mangueirinha direto na boca. Cuspa, diz o do avental vestindo a máscara. Vai doer? Faça ah. AAAHHHH, algodões na boca dele. Espelhinho de mão. Agulha. Expressão de desespero. Não se preocupe. Mão com luva de borracha. Agulha da anestesia na gengiva. Espelhinho de mão. E broca. E alicate. Alicate medieval com designer além de moderno. Sangue. Broca. Sangue. Broca. Alicate. Sangue sangue sangue. Fim da ação. O encosto automático da cadeira levanta. A mão direita tira a luva da esquerda. A esquerda da direita. Vai querer levar o dente de lembrança? Faz que não com a cabeça. Que bom, mais um pros meus colares.

domingo, 10 de junho de 2012


Desço em direção a XV. Quem, como eu, tanto andou por essas ruas antes dessas ruas serem essas ruas? Sim, quem mais amo está comigo, na memória, os tenho comigo o quanto estou só. Escuto-os na sala a tagarelar, o hálito alegre a falar sobre nada. Fico melancólico nessa época do ano. Ouço os pingos na lata dos carros estacionados. A chuva, o frio, não me deixam esquecer, um único dia de sol e tudo estará cegado novamente. Fui crescendo, a neblina e a geada a se infiltrarem em minha pele, em minhas lembranças, no coração sem fundo. Não há nitidez, nada é uma certeza, nem bem me dou conta, estou trazendo o inverno dentro dos tímpanos. Estou mais cansado que um velho. Não se pode reter para sempre os instantes. Que passem. Plenitude é o que vai, some. Esquecer agora talvez seja o jeito humano de guardar. Não quero reter os momentos de felicidade, como alguém que pretendesse o raro de si mesmo. A felicidade me atravesse, não como eu fosse um túnel, mas lama que não admite modelação. Atravesse, não suportaria encarcerá-la o quanto faço com a angústia. A vida acontece conforme o errar se sucede, não como preferimos? O tempo passa para fazer com que as pessoas amadureçam e se tornem melhores? Se você envelhece com pesares e lamentos, o futuro aparecerá como um killer a destruir cada uma das coisas que você um dia amou. É preciso tocar o foda-se, ou a maneira mais ineficientemente tola de abjurar o passado seja o insistir na evitação de que a vida não nos fará esquecer sem que sejamos esquecidos?

quinta-feira, 7 de junho de 2012


*Fragmento da segunda novela da 
Trilogia da Geada em que venho trabalhando.

Como pode querer educar alguém se nem mesmo, pensava, sabe se portar com seus alunos, berrando feito um jegue, jogando coisas neles estupidamente, pensava mas não dizia e dizia apenas
não fiz nada, professor
e ele
não me retruque, para fora
e eu
mas professor
e ele
sem mais nem menos, fora
e lá ia eu passar a hora do recreio de castigo, sem direito a lanche, na sala dos professores, tendo que aguentar o bullying disfarçado de reprimenda do bundão do Freitas, com seus
            o recreio aqui dentro é bem mais altruísta, não é mesmo? Por que não aproveita, já que você é um ótimo aluno, e adianta o dever de casa. Olhem, pessoal, que exemplo, se todos os estudantes do colégio fossem exemplarmente dedicados como este, que belo futuro, mas isso é muito raro, um menino que prefere passar o recreio estudando do que indo brincar com os colegas da turma, ah, que maravilha de aluno.
            Cuidado, eu pensava, não morda a línngua, seu filho da puta, se não quiser morrer do próprio cianureto.

segunda-feira, 4 de junho de 2012


Curitiba, bairro Batel, restaurante King Temaki. sashimi com shoio light, derramo na camisa branca. sempre é assim. música ambiente, um dance hit qualquer coisa. não me sentiria melhor nem mais importante se soubesse citar o nome do DJ como geralmente posso fazer quando o que soa é o vasto repertório mpbístico. Rei Temaki, eu o saúdo: viva o rei! não, não faço a infame piada. para quem? os garçons correm contra o tempo para dar conta dos pedidos. a pequena que eu quero não está comigo. os amigos? alguns não têm moedas nem para coxinha de frango. os outros, se bem os conheço, estão de molho, pois ainda vivem ao fundo o excitamento das madrugadas de sábado. sou o homem sozinho com Formas do Nada, do Paulo Henriques Britto, nos olhos. fora eu, aqui, domingo, junho, 23:04, ninguém lê. nem mesmo meu reino, que não o tenho, mas a nota de dois reais que separei para o guardador de carros, por um leitor. é pouco? que seja, o que trago na carteira, os cartões de crédito, meus tênis, minha meia listrada, de artista, a japona, ah leve tudo o que quiser, mas me apresente um leitor. não, fora eu, aqui, ninguém está sozinho. meus contemporâneos, somos os primeiros poetas no segundo ano da segunda década do século XXI a escrever, mas eu, digo, eu, aqui... ah, façam isso, olhem-me como que para um ET.

domingo, 3 de junho de 2012


*Fragmento de uma nova novela 
em que tenho trabalhado.

No visor do celular, a mensagem do Tadeu: às 10 horas, no meu escritório. Não existe lua quando olho pela janela do apartamento. A manhã virá, para os velhos do centro será o momento de ir a pé à missa. Na rua, ao longe, alarmes disparam, o vento lambe santinhos de publicidade no asfalto. A madrugada não é generosa com nosso sono. A chuva alaga a cidade. Minha memória afogada. Passaram-se anos, tudo o que tenho são borrões de rostos que acreditei ter visto dias seguidos no café da manhã. Vó Bia chegava, sentava e antes de se servir ia servindo todos os outros. Minha mãe colocava um pouco de leite na xícara dela, da tia Ruth e na do meu pai. Vô Breno já tinha se servido e no momento brigava com a manteiga, dura demais para passar no pão. Surgíamos nós vestidos com o uniforme da escola. Ao fim do café, Manoela levantava e ia rápido escovar os dentes, pegava suas coisas e tentava ajudar um pouco Elza lavar a louça enquanto nos esperava. A gente levantava e também ia escovar os dentes. Camilo era o primeiro a ficar pronto. Encostava-se na porta da cozinha e ficava assistindo a arrumação. A luz da manhã em cheio em seu rosto. Seus olhos claros ficavam ainda mais translúcidos e lhe davam o ar de um raro ser angelical. Vó Bia, uma espécie de prece, não completamente inaudível, um farelo de som, movia os lábios. A voz sibilante, o cabelo cinza, as magras mãos, a pele solta do tríceps, as pernas varizes prestes a arrebentar. Os chinelos ao lado da cadeira, no quarto. Deus cuida de tudo, ela dizia e ia perdendo os dentes nos intervalos de seus porca miséria. Os ausentes são o impossível. Quando criança, eu achava que sussurrando uma canção bonita a gente podia falar com Deus. A ausência é modo mais eficaz que Deus tem para provar que não existe. Toda noite volto trazendo uma sacolinha com filmes e algum livro na mochila. Fico lendo na cama, em voz alta, a distrair a insônia. Peço uma pizza, não toco nela. Folheio revistas. Livros comprados em sebos dividem espaço com latas de suco e embalagens de comida pretensamente saudável. Quando é tarde e finalmente estou faminto, o queijo parece um chiclete salgado. Posso lavar a louça outra hora. Lá fora, escuto o ônibus madrugueiro.  Buzinas, para que não esqueçamos onde estamos. Moro no oitavo andar. Nunca sei se está sendo uma noite difícil. O que tenho para hoje, dentes a escovar. Minha escova não é das mais macias. Onde os cachorros da vizinhança? Cansaram de uivar? Abro a janela. O ar é frio e no céu estão entediados anjos da guarda. Vem entrando a madrugada. Gatos miam nos becos, ninguém dá por eles. E estes gatos que ouvimos chorar de madrugada são a reencarnação de crianças mortas prematuramente. Estará Camilo entre elas? Chovia naquela manhã. Camilo inventou de adiantar um serviço para meu pai, chegou antes do restante do pessoal. A serra elétrica mastigou seu corpo. Não sei como aconteceu. Ninguém jamais saberá. A assassina serra circular cortou o braço. Entrou pelas costelas, chegando ao abdômen. Rompeu a alça intestinal. Atingiu o pâncreas. A dor e a hemorragia mataram Camilo em minutos, nada pode ser feito. Vejo ainda seu corpo destroçado sendo carregado para a caminhonete, com seu velho pulôver azul, feito por vó Bia, não mais identificável. Foi Tadeu quem logo virou o braço direito de meu pai e depois passou a dirigir a fabriqueta de móveis, o que, na verdade, foi acontecendo da maneira mais natural possível. Depois que Camilo partiu, tia Ruth entrava naquela espécie de transe de quem está fisicamente presente mas com a cabeça a flutuar no espaço de uma ausência. Deixo a janela aberta. Volto para o sofá, vivo nesta nave vermelha pilotando a televisão, ora roncando baixo. Tenho de ir ao banco para as contas de água, luz, gás. Não terei como fazer isso amanhã. Raspo a unha no visor do celular, a vibração da mensagem: às 10 horas, no meu escritório. Estou dormindo sentado, igualzinho o vô Breno nas tardes de sábado. A urgência não tem escolhas, por isso é burra. E eu? Sou como os pombos da Praça Osório tateando o chão.

sábado, 2 de junho de 2012


as missas não mais em ucraniano. sou uma espécie de latin lover sem bigode na saída da Catedral, olhando passar meninas brancas embrulhadas em lã. tenho um cigarro nos dentes e nunca mais a preocupação de não levar uma bronca da vó. cachorros longe latem o sangue das veias. sábado amanhece o centro velho. os sinos abalam o vôo das pombas. girinos nos lagos do Passeio Público, lâmpadas fosforescentes dentro da neblina. a Ilha da Ilusão a abrigar uma barraquinha de cachorro-quente. um simbolismo impertinente, fora de época. o mesmo magro odor de encontrar o fantasma do Emiliano Pernetta acenando um bom dia feito dissesse uma reza positiva.