terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

na verdade não era

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Robert Downey Jr. como Sherlock Holmes .

.....A liberdade é uma mulher sem calcinha

.....Eu estudava direito e fazia estágio num escritório do Centro Cívico. Certa vez entrava no escritório e vi um hippie. Caramba, pensei, um hippie?, em pleno centro cívico, de sandálias e camisa aberta no peito, barba e cabelos enormes, e eu um piá de bosta, 19 anos, de terno e gravata. No dia seguinte nunca mais fui ao estágio, nem para faculdade de direito. O hippie foi a melhor má influência que tive. Esse bem que podia ser um breve prólogo, tipo o Detetive entra em cena e diz exatamente isso: Eu estudava direito e fazia estágio num escritório do Centro Cívico. Certa vez entrava no escritório e vi um hippie. Caramba, pensei, um hippie?, em pleno centro cívico, de sandálias e camisa aberta no peito, barba e cabelos enormes, e eu um piá de bosta, 19 anos, de terno e gravata. No dia seguinte nunca mais fui ao estágio, nem para faculdade de direito. O hippie foi a melhor má influência que tive. É um bom prólogo. É bom, não é bom? É bom. Eu acho. Mas tá faltando alguma coisa. O quê? Não sei. Talvez isso: Por tais motivos, muitos acham que não sou um profissional dos mais confiáveis. Só porque não ostento um diploma na parede. Boa, são duas boas frases. E mais: Também acreditam alguns que sou mentiroso. Dizem que forjo minhas provas. É que possuo uma mente inventiva. Ele bem que pode dizer isso, não pode? Mas não confundo as coisas. Sei muito bem que ficção é ficção e realidade é realidade. O problema é que a realidade só é palpável no presente. Depois, quando fazemos o registro, quando documentamos, quando dependemos do passado, depois, nenhuma garantia terá a realidade de que será avaliada com os olhos críticos da ficção, que é, no fundo e em essência, mais crítica que o blábláblá dos críticos reais. Taí, agora sim, acho que é assim que se encerra o prólogo dele. Ou melhor, ainda não. Ele ainda pode dizer: Mas devo admitir, um sábio não agiria como geralmente ajo. Onde já se viu?, dizem por aí. Um sábio, aliás, jamais seria o que sou. Ser o que sou nessa cidade não é mole. Agüentar esses bandidinhos caçadores de Robins Hood. E o que sou? É essa a última pergunta do prólogo dele. E o que sou? É assim que se começa uma boa estória com esse tipo de pergunta, poxa vida: O que sou? E o que é ele, hein? O Detetive? O Detetive. O cara para quem entregaram alguns envelopes roxos. Ninguém disse nada, apenas entregaram os envelopes e os dólares. E ele? Ele o quê? Como reagiu? Dizendo: Darei um esporro na secretária. Isso quando e se ele puder pagar o salário da secretária e ela resolver ser boazinha e aceitar trabalhar para ele novamente, daí sim ele pode dizer: Darei um esporro na secretária. E ainda completar assim: Por que a senhora não anotou a porra do nome da pessoa que trouxe os envelopes? Interessante, interessante. É assim que sou, estaria nos dizendo o Detetive agora. Um caloteiro? É assim que sou. Essas são as frases que vão se entulhando no monólogo interior do Detetive. O monólogo interior fazendo com que ele sempre se pergunte: Onde já se viu um detetive sério e renomado não saber quem lhe entregou o material e o pagamento dentro desses alguns envelopes roxos? Hum, deixa eu pensar. Pensar , pensar, pensar. Pensei. Então, recapitulando: Onde já se viu um detetive sério e renomado não saber quem lhe entregou o material e o pagamento dentro desses alguns envelopes roxos? Essa frase é péssima, aliás. Ou melhor, eu gosto. Digo, a não ser que seja um melodrama. Aliás, não necessariamente. Ou, necessariamente? Não necessariamente. Tá, tá bom, não vamos entrar nesse joguinho outra vez. Vamos em frente. O que estariam tentando amenizar entregando fotos de comprovada traição justo dentro de tais alguns envelopes? E mais. Por ter caído na teia dela, da secretária que, depois da bronca, depois mesmo dela ter feito biquinho e chamego, depois dela ter chamado o Detetive de Meu duro de matar 5, depois dele ter esquecido tudo, esquecido da vida, e ter acabado aceitando o convite para pizza de calabresa em sua quitinete... Pizza? Pizza? Será? Pizza sim, umas cervejas... E então, depois de tudo isso, o Detetive viria a ficar sem palavras. Assim... Depois de tudo isso... A secretária chegará no escritório. E dará bom-dia para ele. Como se dar bom-dia fosse a coisa mais natural do mundo. Mas, ora, dar bom-dia é a coisa mais natural do mundo. Era. O quê? Digo, era, era a coisa mais natural do mundo. Pelo menos no caso dela era a coisa mais natural do mundo. Mas por que era? Porque ela foi despedida e não voltará, elementar. Tem razão, vocês agora dirão. Ou então, outra hipótese, porque ela não foi despedida, mas... Mas não recebe o salário atrasado faz mais ou menos uns cinco meses. Entendem, por isso a secretária não voltará. Pelo menos não logo um dia depois de ela ter envenenado o patrão. Você envenena alguém e no dia seguinte dá bom-dia com essa cara de santa? Eis o monólogo... interior, vocês sabem. Santa do pau oco. Essa mulher, eu conheço as mulheres, jogou, voltará a jogar, comigo. Esse Detetive, vão reparando, é o rei do monólogo interior. De modo que continua a pensar: E se eu não pagar? E se eu disser que está comprovado que ela é minha amante. Que ela é tão minha amante que chegou ao ponto de me envenenar. Ou então que ela me enlouqueceu com essa coisa de bom-dia, todo santo dia, dissimulado? A coisa está se complicando. É melhor o Detetive esquecer a aproveitadora da secretária de uma vez por todas e se concentrar no trabalho. Ao trabalho, ao trabalho. Isso, é melhor mesmo.

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