quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

revista lama ganhando o mundo

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Matéria muito bacana que o escritor e jornalista Daniel Russel Ribas publicou no site Almanaque Virtual. Confira aí.
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Chegou às lojas especializadas a revista Lama que tem a ambiciosa missão de trazer as publicações de mistérios descompromissadas brasileiras para o século 21. Com forte apelo visual, Lama poderia ser descrita como o equivalente em papel do projeto Grindhouse. Para quem não sabe, Grindhouse foi um projeto dos cineastas Quentin Tarantino e Robert Rodriguez, em que cada um dirigiu um longa-metragem baseado na estética de produções de gênero B dos anos 70. No Brasil, os filmes foram separados em Planeta Terror e À prova de morte (ainda inédito!). O editor e criador da Lama, Fabiano Vianna, não nega as semelhanças. Nem poderia, pois, com as devidas diferenças, a proposta é a mesma. É uma sofisticada homenagem às edições baratas de histórias sensacionalistas, inspirando-se no talento que dessas emergiu para reunir um grupo de colaboradores de renome e recriá-las com uma visão atual. Em suma, mantendo o espírito, remetendo esteticamente ao antigo e com cuidado de produto novo.
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O time de autores deste número é eclético, tanto em estilo quanto em conteúdo. Há desde escritores assumidamente do universo fantástico, como as especialistas em textos vampirescos Martha Argel e Giulia Moon, a autores sem tradição no gênero, como Simone Campos e Luiz Felipe Leprevost. Além dos veteranos, nomes novos como Daniel Gonçalves e outros ainda pouco conhecidos como Gisele Pacola e Rodriane DL. A mistura, inusitada a princípio, funciona bem. Os contos têm personalidade própria e utilizam de forma livre a premissa presente na capa: Fantasia, suspense & terror. Logo, há uma unidade que destaca o conjunto e não partes individuais; uma falha comum em antologias com colaboradores vindos de obras tão distintas entre si.
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Vianna apresenta dois trabalhos seus: 17 e 30 já é noite em Curitiba, uma fotonovela, e A ideia, um conto. Se o primeiro é policial B com estética inspirada em Dave McKean e Frank Miller, o segundo é uma narrativa leve com toques de Richard Matheson. Em ambos, o autor extrai bastante humor do absurdo das situações. É óbvio que ele conhece, ama o gênero e se diverte muito com ele, sensação que passa para os leitores, que se tornam cúmplices da brincadeira.
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As escritoras Ana Paula Maia e Giulia Moon se destacam em retratar com beleza tramas violentos, respectivamente em Teu sangue em meus sapatos engraxados e Gueixa. Se Teu sangue... prende pelo peso das metáforas e imagens, Gueixa se vale das descrições belas e da delicadeza da narrativa, mesmo em seu final chocante.
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Simone Campos e Assionara Souza enfatizam o fantástico no cotidiano em O Aleph de Botafogo e Mórbidas confissões, mostrando como o inesperado pode ser visto e apreciado por àqueles dispostos a observá-lo.
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Daniel Gonçalves e Emanuel R. Marques, responsáveis respectivos por No silêncio da mata e A carta, contam boas histórias de fogueira em formato de prosa. A primeira, uma fatídica caçada, e a segunda, uma assombração em uma pequena vila portuguesa.
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Martha Argel e Luiz Felipe Leprevost bebem do universo pop para a reinterpretar dois monstros conhecidos, em Álbum de Família e Dr. Hannibal apaixonado. Enquanto Argel é mais fiel ao mito em uma construção sólida e com o humor negro que lhe característico, Leprevost se liberta da fonte de origem, em um misto de poema e carta de amor engraçado, erótico e sentimental.
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Os textos O anjo da USP, de Gisele Pacola, e Caramelos estragados, de Rodriane DL, encerram a antologia, em narrativas que valorizam mais clima do que ação. Ambos não possuem o mesmo impacto dos anteriores, mas brincam com expectativa e clima, características fortes do pulp, de maneira eficaz e instigante.
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No time de ilustradores, encontramos outra benvinda diversidade. Os ilustradores e estúdios Pianofuzz, Mopa, Yan Sorgi, Francisco Gusso, Daniel Gonçalves, Firmorama, Sueli Mendes e Bruno Oliveira extraem a dose exata de bizarro e entretenimento em suas interpretações para os contos-base. O embate entre crueza e lirismo de Pianofuzz para Teu sangue... casa com a contradição presente no texto. A simples e elegante ilustração de Mopa para Gueixa é eficaz e misteriosa. As pernas abertas de Yan Sorgi para Mórbidas confissões anunciam a decadência que está por vir. O canibal e sua musa criados por Francisco Gusso para Dr. Hannibal apaixonado são divertidos, belos e grotestos na medida. Daniel Gonçalves já um excelente trabalho em mostrar uma criatura medonha sem revelar sua forma, envolvendo-a em sombras para No silêncio da mata e volta a trabalhar com insinuação em Álbum de família, com efeito humorístico e A carta, em imagem que remete a que pode ser um fantasma. Sueli Mendes pega o aspecto juvenil e pop de A ideia e O anjo da USP, levando as tramas para o universo de quadrinhos que lembra Terry Moore. Firmorama homenageia a ficção B dos anos 50, onde a rotina escondia terríveis verdades, em O Aleph de Botafogo. Por fim, Bruno Oliveira permeia de estranheza e belas imagens quase infantis uma paisagem desolada, ressaltando o caráter aberto dos micro-contos de Rodriane DL.
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A revista é trimestral e aceitará colaborações de autores inéditos a partir do terceiro número (o segundo já foi fechado). No Rio de Janeiro, exemplares estão disponíveis na livraria Blooks (no Unibanco Arteplex), a loja Cucaracha, em Ipanema e o sebo Baratos da Ribeiro.
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Serviço.
Autores: Fabiano Vianna, Ana Paula Maia, Giulia Moon, Assionara Souza, Luiz Felipe Leprevost, Daniel Gonçalves, Martha Argel, Simone Campos, Emanuel R. Marques, Gisele Pacola, Rodriane DL.
Páginas: 58
Preço: R$ 10
Daniel Russell Ribas
01/12/2009
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Para saber mais sobre a revista Lama: Blog e site do editor Fabiano Vianna
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