sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

duas epígrafes

Se e quando eu começar a ter consultas com um analista, espero ardentemente que ele tenha o bom senso de convidar um dermatologista para participar das sessões. Um especialista em mãos. Tenho cicatrizes nas mãos por haver tocado em certas pessoas. Uma vez, no parque, quando Franny ainda era levada para lá no carrinho de bebê, passei a mão, por tempo demais, na penugem que cobria a cabeça dela. A outra vez aconteceu no cinema da rua 77, quando eu assistia com Zooey a um filme de horror. Ele tinha uns seis ou sete anos, e se enfiou embaixo da poltrona para não ver uma cena assustadora. Pus a mão na cabeça dele. Certas cabeças, certas cores e texturas de cabelo humano deixam marcas permanentes em mim. Outras coisas também. A Charlotte um dia se afastou correndo ao sairmos do estúdio, e eu agarrei seu vestido para fazê-la parar, para mantê-la perto de mim. Um vestido de algodão amarelo que eu adorava por ser comprido demais para ela. Ainda tenho uma mancha amarelo-limão na palma da mão direita. Ah, meu Deus, se há algum termo clínico que sirva, sou uma espécie de paranóico ao contrário. Suspeito que as pessoas estejam sempre conspirando para me fazer feliz.
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(...)
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_ afirmo que o genuíno artista-vidente, o divino imbecil que produz beleza, morre ofuscado por seus próprios escrúpulos, pelas formas e cores deslumbrantes de sua própria consciência, sagradamente humana.
..........Eis aí meu credo.
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J.D. Salinger

Essa postagem vai para Nina Rosa Sá,
Fal Azevedo, Elísio Brandão
e, já era hora, Uyara Torrente.
Pelo amor a arte do Salinger.

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