sábado, 15 de agosto de 2009

o pão brutal de ontem

Condimínios no Pilarzinhos
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Apenas o que se lê nos jornais diariamente
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No Pilarzinho os motoboys fazem o que querem, curvas e ladeiras são suas casas, empinam motos, outros passeiam a pressa. Passam Kombis da Prefeitura. A Moça do Senso com sua prancheta. Vê-se faixas de agradecimento ao vereador, penduradas em ruas onde chegou o anti-pó. Proliferam Vidraçarias, Materiais de Construção. Proliferam casas com a placa de “cuidado, cão anti-social” no portão. Proliferam Cabeleireiros Unissex no redor de ruas e ladeiras sem saída, algumas com placas de trânsito informativas, outras um buraco sem aviso, abismos que levam à vales onde estão os casebres mais pobres, onde há na parede escrito em carvão “vendo bom-bom caseiro”, onde alguém terá deixado no poste de madeira a mensagem “corto árvores, ligar número tal.” Na parte alta, pracinhas com gangorra e escorregador, alguns manos fumando maconha. Deveras bucólico e triste, conforme o ângulo da análise. Alto índice de violência? Não. Apenas o que se lê nos jornais diariamente. Cruel, não é mesmo? Algo que beira o corriqueiro. A não ser que a construção civil em parceria com especuladores imobiliários tenha papel significativo em relação ao aumento populacional, contribuindo assim com as taxas de incivilidade. Diga você. Há o Bar dos Polacos. Nele, caso você esteja à base de água mineral, o bairro se torna um tanto tedioso. Cachacinhas de mel e banana provocam efeito oposto. Há riscos de porre, então você terá de enfrentar a fila de vômito do banheiro do Polaco, experiência inesquecível. É um bairro mais que suportável, menos que agradável. Até hoje está lá a famosa Cruz, onde um certo poeta costumava pousar (é “pousar” mesmo!) nas fotografias. IPTU?, de valor intermediário. Bom para mansões, ruim para casebres atropelados por tais mansões. Ainda não está adoentado. Propicia vista de um belo horizonte, com intervalos de Ligeirinhos e caminhões do Lixo que não é lixo atravessando os olhos do contemplador. Vê-se oficinas de carros com gordos abaixados mostrando o cofrinho, calças sujas de graxa. Tratores estacionados, alheios ao trânsito. Há instituições ilustres habitando a região, exemplo é o Sanatório Bom Retiro, onde espero não acabar os meus dias. Ou (quem sabe, não é mesmo?) eu deveria estar dentro do nosso nobre hospício? Mas sigamos: Ao lado do Bom Retiro, há terrenos com porquinhos da índia e galinhas. Perto dali, o Bosque do Alemão. No Bosque, a Torre dos Filósofos, onde alguém escreve que o lugar é “destinado à observação da natureza e da cidade. Uma homenagem a todos os que se dedicam à escalada do pensamento, à vertigem do espírito, dentro da antiga tradição da filosofia e blablablá.” Sobre a destinação da Torre algum outro comenta por meio de pichação o seguinte: “Porcos chauvinistas, a cidade é nossa, sucumbirá aos pés dos oprimidos!” Preocupação, não das maiores, para a Guarda Municipal. A parte interna do bairro onde moram minha mãe, minha irmã e seus filhos, abriga ainda hoje pequenas chácaras de agricultores que estão, em grande parte, sendo vendidas a preço de banana para que as transformem em conjuntos habitacionais. Capivaras que mais parecem peludas pedras, guardiãs dentuças, locomovem-se nesse lugar que outrora foi colina. Rondam o condomínio, e isso não é nada estético. Minha irmã deseja mudar de endereço, ir para apartamento mais central, onde bichos de garras, presas, roncos e guiso existam (pois existem a nossa revelia), mas estejam bem escondidos nos subterrâneos, e só ousem emergir de tais esgotos quando corre alta e fria a madrugada. Por enquanto seu automóvel sobe e desce as grandes ladeiras levando meus sobrinhos. Ela, ora fotografa, ora acena para vizinhança de varandas que armazenam neblina. Casas com paredes infiltradas pela umidade, onde guriazinhas gripadas brincam de “casinha”. Já minha mãe é diferente de sua vizinha que cochila das 13:30 até 14:30, diariamente, após o almoço. E minha irmã, por sua vez, nem fica sabendo que no ponto de ônibus resmunga algo banal uma outra senhora antes de embarcar. Mais em frente, uma bicicleta esquecida sem corrente e cadeado descansa encostada na parede do armazém. Pilarzinho... e as manhãs são frutas típicas de inverno, especialmente mimosas, que ao anoitecer ainda não terão apodrecido. Funcionários públicos, aos sábados, lavam o automóvel com mangueira na calçada. A piazada se algazarra com o bete-ombro no campinho de várzea. Há duas ou três escolas públicas, onde não estudam os filhos da minha irmã, que são trazidas até o Colégio Positivo diariamente. Alessandra, menininha de 7, e Roberto, um piá de 5 anos. Mochila nas costas, lancheira na mão, fazem companhia um ao outro. Cuidam-se. O cadarço do tênis do Rô insiste em desamarrar, a irmã é quem se abaixa e dá o laço. Eles não conhecem os moradores do bairro. Eles não acenam para o moço da farmácia, a atendente da panificadora, loja de onde uma gorda se aproxima carregando saquinhos de pão e leite. Ale e Rô não comem casas inteiras de chocolate, feito ocorre nos contos dos irmãos Grimm, mas se lambuzam na hora do recreio. Ele é bom em matemática, ela só gosta de educação artística. A diretora da escola é uma bruxa, diz Ale para sua mãe (minha irmã), quando ela vai apanhá-los depois da aula, justamente quando o sereno começa a se apropriar da cidade, minutos antes de serem assaltados no portão do condomínio onde moram, quando dois sujeitos encapuzados os abordam e, brutos, fazem-nos encaminhar para dentro da casa de minha mãe. Lá, violentam minha irmã. Espancam minha mãe até a morte. E promovem maldades indizíveis com as crianças, cujos detalhes me causam vômitos sanguíneos só de lembrar.

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