segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

na verdade não era

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.....Curso sobre colisões
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.....Uma rua. Um restaurante. U está no restaurante. Tenta esconder das outras pessoas o choro. Todos percebem que U tenta esconder o choro. Ninguém vai consolá-la. Há garçonetes. Servem as mesas sem ao menos olhar na cara dos clientes. Foi-se o tempo em que as pessoas entravam em qualquer restaurante e eram atendidas por garçonetes de verdade. Estas que ali estão são garçonetes universitárias. Vieram do interior. U também veio do interior. As garçonetes universitárias estão somente fazendo um bico, quebrando um galho. O pouco dinheiro que ganham vai para o supermercado, necessidades básicas. Algumas gastam com drogas. Outras gastam com shows na Pedreira Paulo Leminski. Cada uma gasta como bem entende. Há quem faça abortos. Outras, claro, confiam que o destino lhes aguarda com empregos em multinacionais. Há as que tentam casar com homens ricos. E tem aquelas que estão felizes como estão. Por enquanto servem pratos feitos. Não dá para saber se são comidas típicas de algum país as que servem para U no momento. Mas dá para saber que são comidas esquisitas. Podem ser confundidas com joelho, orelha, cartilagem. Borbulham em gordura. Alguém poderia até pensar que fragmentos de um ser humano estão sendo servidos ali. Que noje. Nojo? Pois é. E U? Come? Chorando, mas come. E as garçonetes? E as garçonetes lá, com aquelas bundas e narizes empinados. Onde fica? As bundas nas bundas, os narizes nos narizes. E o restaurante? Já disse, em uma rua. Qual? Não sei. Mas no restaurante existe um sujeito trabalhando no Caixa. E o sujeito é um cachorro. Um cachorro mesmo! Os clientes quando vão pagar a conta ficam surpresos e dizem Pode ficar com o troco. U também? Claro. U paga a conta com uma nota de dez e diz que ele, o Cachorro, fique com o troco. O sujeito do Caixa agradece fazendo Au-au. E abanando o rabo. Na saída U fica absorvida pelo aquário embutido na parede. São doze peixes. Todos vermelhos pendendo para o roxo. Todos com olhos muito roxos pendendo para o negro fundo de bueiro. Enxergando aqueles peixes U sente uma terrível angústia. Acha que vai colapsar. U sabe que está num afogamento sem volta. Coitadinha. Os doze peixes. Aquele aquário. De repente o Cachorro do Caixa grita Hora de fechar! E abre as escotilhas do aquário. Os doze peixes agonizam no chão de madeira do restaurante. Os clientes caem fora. U sai junto, afobada. Na fuga, com aquele misto de angústia e afobação, U pisa e esmaga um dos peixinhos. Muito engraçado.

4 comentários:

  1. Que nojo! Pois é. E eu? Leio? Com nojo, mas leio.
    E depois rio, ai, tadinha ela pisou e esmagou um dos peixinhos. Engraçado? Muito.

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  2. valeu cgfernandes... bacana você de tão longe por aqui. vi que você já dominou a estilística desse meu texto, haha. muito bom? muito. bj. lepre.

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  3. É um prazer ler os seus textos!
    Beijos,

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