sábado, 23 de maio de 2009

Jorge Barbosa Filho, o Jorge do Irajá

Certa vez um crítico amigo meu (hoje ele está longe de Curitiba), com o qual geralmente não concordo, disse-me assim: "poeta é quem transforma as trevas em algo admirável, e não o contrário." Quase nunca entendo o que os críticos pretendem com suas máximas. De qualquer forma, parece-me que um poema insuperável como esse do Jorjão funciona como um nó bem dado nas entranhas de qualquer um. Um dia escrevi: quem volta do inferno traz o inferno. Quando canto-declama, Jorge é infernal como uma banda de rock da década de setenta. Quando escreve, ele me lembra o melhor Paul Verlaine, aquele de depois de ter sofrido agudamente com Rimbaud. E hoje é aniversário do Jorge, a rapaziada vai comemorar logo mais no bar Estava Escrito, rua Vicente Machado, 578, Batel. Vai ter show com um bando de maluco da pesada, a partir das 19:30, e segue até a polícia chegar, segundo informa a divulgação do evento. Aí vai o poema do cara.
..
meu anjo da guarda
me pegou cagando
.
meu flato fanho assobia
uma melodia gasosa
com suas flores amorfas.
e em sua epifania
(nem de ontem ou agora),
a gula viva de outrora
anuncia minha intestina
agonia infinita.
..
véspera de hecatombes
onde, entre os homens,
borbulho o que sinto
e invejoso me vingo
de seus horizontes.
o ar de suas alegrias, definho
sem jeito, como ou aonde,
solto mil bois divinos.
.
infesto a eternidade
com odor duvidoso
de tênue bondade,
mas cobiço as beldades
e os tesouros dos outros.
quando pensam que dôo
a lei da gravidade,
flutuo, explodo,
.
espalho meus vícios
por todos os poros
e se a alma expio,
relaxo com reforços.
se existe o difícil
(é disto que eu gosto),
desloco o impossível
por isto me borro.
.
a comédia divina
percorre minhas vísceras
em onírica soberba.
como reza a bíblia,
sem eira e nem beira,
da cósmica poeira chega
e fina o que se destina,
a merda em suas bigas
.
no cu do mundo,
na casa do orvalho,
o jardim das delícias, fundo
e afundo no ato falho,
alhos com bugalhos.
meu desejo confundo
ao todo confuso,
lúbrico no sanitário
.
esqueço onde estava
e pelo espaço errando,
caíram minhas máscaras
no vaso urrando
só, na ira, não podia nada,
isto foi quando
meu anjo da guarda
me pegou cagando.
Jorge Barbosa Filho

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