quinta-feira, 7 de maio de 2009

pecinhas para uma tecnologia do afeto

Um sapo, um baiacu

Um- Posso pôr meu coração a seus pés.
Dois- Se não sujar meu chão.
Um- Meu coração é limpo.”
(
Heiner Müller)
É um figurino estranho. Ela parece, muito, vestida de si mesma. A máscara que usa é mais louca ainda, é como ela se mascarasse com o próprio rosto.

Em algum momento do texto, ou durante o texto todo, fica a cargo da atriz, ela deve rezar. É uma reza inédita e inaudível. Física. É uma reza física. Mais se assemelha a uma dança a reza. A reza é assim: Chega de permitir que a memória ocupe o espaço do que dever ser a vida, chega de achar que a dor não vai passar, chega de achar que está sozinho, chega dessa vontade de rever, chega de saudade, chega de saudade, não tenha medo, aceite isso.

não vou falar que tenho coração
não pra você
pois se aqui estou
é porque estou viva
e se estou viva
é porque tenho coração
e se tenho coração
ele é uma coisa que pulsa
um sapo ou um baiacu
um sapo ou um baiacu são
coisas que pulsam
é por isso que eles dois

Há um sapo e um baiacu em cena

são o coração que me refiro
então, esse coração
ou esse
tanto faz
é um coração que pulsa
sim, pulsa
mas por aqui
a gente gosta de dizer
não que ele pulsa
mas que ele bate
então se bate
bate por quem?
bate por você que tanto venero?
vou dizer que te amo
que te venero
e daí se eu não devia fazer isso?
se te venero
deve ser por você que o meu
sapo, digo, coração bate
mas não
não é por você que o meu
baiacu, digo, coração bate
ele
ou ele
bate por mim
para me manter viva
ele
ou ele
bate para que eu possa continuar
a fazer declarações de veneração
feito essa
na qual você ainda sequer reparou
essa que é só pra você
pra você, pra você
que até o momento parece ignorar
que eu tenho um sapo
um baiacu
um coração em cena
um coração aos teus pés

5 comentários:

  1. e resolvi te mandar uma coisa:

    Eu quero te dar o que já é seu!...
    Não faça comigo o que faço com todos, apesar de tudo, o mundo não pára, o sol quer dar o seu presente, por isso não espere de mim os braços abertos que tanto sonhou, espere que a chuva chova quando tiverem gotinhas gorduchas pesando sobre sua cabeça. Apesar de você não me dizer, eu já sei. Eu só quero que você saiba todos os meus segredos. E sem se conter, me diga e me faça ser o quanto antes.
    Quero te dizer que hoje eu vi o mundo girar sem você ter que empurrar.
    Consegui uma melodia sem você ter que me ouvir. Ouvir...não quero mais!
    Quero falar, vomitar tudo que escondo por baixo dos meus cabelos, além do meu suor molhado que escorre até secar no chão.
    Ás vezes penso no egoísmo como falta de sentimento humano, mas ás vezes penso que não, que é um bem próprio para si. Quero me fazer bem, fazer as minhas escolhas no tempo que não é certo, ou antes ou depois. Só isso.
    Me faz um favor: gira e perta o play, mas de vez enquando me dá um pause, pra vida descansar e o tempo parar de correr, ou, já que correr é tão bom, me deixa ver lá na frente!...como tudo isso vai ser...caso eu chegue.

    Escrita automática: 06-05-2009

    kelly

    ResponderExcluir
  2. texto lindo kelly, à flor da pele. viu tua pecinha bom ar? é a que mais gosto, por ser a mais livre e denunciadora. bjs. lepre.

    ResponderExcluir
  3. eu ainda não sei o que fazer com isso que sou tão eu mesma, vestida de mim, rezando, tentando aceitar, tantando não ter medo.

    a pergunta sempre recai sobre ela. estará ela lá na primeira fila me olhando com olhos julgadores e pensando que uma hora ou outra essa ladainha precisa cessar? talvez.
    mas é isso mesmo.

    chega de saudade. vai minha tristeza...

    o texto é lindo. sinto-me honrada. e um bom tanto assustada.
    meu baiacu, meu sapo, ele ou ele, bate sim, bate por mim. mas também bate por você.

    ResponderExcluir
  4. um baiacu morre na areia. um sapo é esmagado. mas a gente vai resistindo. até quando, até quando? bjs, nimosa. lepre.

    ResponderExcluir